Esta é mais uma APOSTA POPULARFM!
A história dos Virgem Suta não é a história normal das bandas de hoje em dia. Não foram descobertos através do Myspace, não fizeram uso das autoestradas da informação para conquistar os milhares de fãs com que poderíamos abrilhantar esta nota. Valeram-se de duas guitarras, da voz e da quase ‘ousadia’ de uma mão cheia de canções e, sem exageros líricos, as suas autoestradas foram outras. Perderam a conta às vezes que fizeram o País de Sul a Norte e de Norte a Sul. Mais uma vez, não o fizeram como as bandas normais, a tocar em todas as aldeias e terriolas onde os quisessem a actuar. Não! Habituem-se. Em Suta é um estado exagerado de estar, de viver, de pensar. Eles eram virgens no mundo da música e quiseram demorar o tempo que fosse necessário para se considerarem prontos. Conseguiram-no e brindam-nos com uma belíssima estreia.
Ah! É preciso dizer que os Virgem Suta residem em Beja. E aí o tempo, é relativo.
Mas voltemos atrás. Voltemos à altura em que os dois Sutas se conhecem. Quis a casualidade que ambos namorassem duas reparigas que residiam na mesma casa. Nuno, o introvertido, Jorge, o espalha-brasas, quase chocam na sala de estar da dita casa. Nuno tocava guitarra, Jorge por acaso cantava numa banda. Não, não houve estrelinhas e olhares cúmplices por tamanha coincidência. Consta até que houve uma certa animosidade de início, que Nuno não é reconhecido como um rapaz de imediata empatia com os outros, e tal! Mas nós aqui não somos de tricas e, o que é certo, é que, se há Virgem Suta hoje, deve-se ao facto de, para além do talento goraz que os assoma, estes dois não passarem mais um sem o outro. E não passam, desde aquela noite, naquela sala de estar em que Jorge convidou Nuno para um dia sairem. Sem querermos romantizar o convite, este foi o momento que proporcionou aos dois perceberem o que tinham em comum: a música.
Conta Jorge, que nos mil e um empregos que já teve, uns mais aborrecidos do que os outros, a sua grande escapatória era escrever. Viajava muito de carro e era nestas viagens que gravava palavras e frases que via na estrada, para mais tarde voltar a pegar nelas e compor. Vindo de um bairro pobre de Beja, o mais comum era vir-lhe à cabeça letras reivindicativas, de cariz revolucionário. Cita nomes como José Mário Branco ou Zeca Afonso como referências, e em todas as bandas que teve até aos Virgem Suta, tentava dar-lhes esse cariz. Agora, quando se ouvem as canções do álbum de estreia dos Suta, reconhece-se-lhes esse pendor revolucionário, acertivo, provocatório, próprio de um contador de histórias que cresceu a ouvir outros a contá-las, histórias da revolução que marcou a sua geração, como a primeira a viver sem se dar conta que existia liberdade.
E se esse lado não for imediato a quem ouve os Virgem Suta, isso deve-se ao facto de onde está o Jorge, também estar o Nuno. Não há pudores em afirmá-lo. Nuno é o contra-ponto deste lado efusivo. Não estranhem que se apresentem como um sendo o Suta, o outro o Virgem. Porque antes, Nuno escrevia as suas canções e não mostrava a ninguém. Sofria do mal dos poetas perfeccionistas. Aqueles que nunca estão satisfeitos com o que produzem. Mas ao contrário dos que ficam bloqueados com isso, incentivado por Jorge, ainda que de forma mais introvertida, mais feito de quotidianos, mais subtil, Nuno é hoje a peça de equilibrio, que, em vez de ser contido, estrutura, delimita, enquadra, persegue...
Foram estes dois que pegaram nas suas guitarras e se puseram a caminho de Gaia, onde foram aceites como banda concorrente de um concurso de música. Reza a história que foram porque não tinham nada a perder. O Nuno nasceu no Porto, tem a sua familia lá, pelo que, ainda que tudo corresse mal, não lhes faltaria comida e cama lavada. Dizem eles que, ainda hoje, não percebem o que ali se passou. Eram todos melhores, mais banda, modernos e com bateristas. O que teria levado o júri a seleccionar aqueles dois estarolas a dar-lhes o segundo lugar e o prémio revelação? Ainda hoje estão para saber e caiem na fácil visão de um destino feliz. Quis esse destino que no júri desse concurso estivessem Hélder Gonçalves e Manuela Azevedo dos Clã. Mais boquiabertos ficaram, quando o ilustre júri a eles se dirigiu, não só os cumprimentou, como os elogiou, trocou contactos e veio a estabelecê-los mais tarde.
Passaram cerca de 10 anos desde esse feliz episódio, qual filme de Jonathan Dayton. Só que em vez de uma little miss sunshine, os reis do concurso foram dois marmanjões, vindos do interior do País, dispostos a serem músicos. Sempre apoiados na conselheria e depois na produção do disco por Helder Gonçalves, os Virgem Suta penaram até ao vislumbre de um trabalho decente. Foram muitos os mails trocados, as viagens para lá e para cá, as certezas de que agora sim teriam um bom trabalho, para, logo de seguida, desconstruirem tudo de uma só vez. Pensaram em desistir várias vezes. Não bastava um poeta perfecionista como também um produtor exigente. Pensaram que nunca seriam capazes. Deram-se-lhes prazos para a partir dali irem mas era plantar couves. Não sabem até hoje dizer o que os fez continuar... e persistir. Não sabem também afirmar o que fez os outros irem acreditando neles. Adivinham que fosse aquela vontade tão grande de fazer música à séria, como faziam os grandes.
Passada quase uma década de amadurecimento, os Virgem Suta acham-se preparados para nos apresentar o seu trabalho de estreia. Naquela dúzia de canções que compõem o disco, nas repetidas audições, consegue-se perceber o que os caracteriza e porque vão agradando a quem quer que os oiça. Porque não descartam a tradição, transpiram portugalidade e assumem-no. Mas são tão contemporâneos que a raiz portuguesa só lá está porque não têm outro remédio. Não tenhamos dúvidas que se fossem espanhóis, tocariam castanholas. Assim, tocam adufe e cavaquinho porque é isso que lhes é natural. A isto aliam uma ironia que aparece a espaços, insólita, não de riso fácil, mas daquele que só é esboçado depois de se ter desconstruido a mensagem.
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